O meu primeiro contacto com o Vinho dos Mortos já tem quase 20 anos e aconteceu numa viagem de amigos pelo Nordeste, onde todos os dias comemos posta.
Para os que não sabem, nós então não sabíamos, existem muitas formas de apresentar a posta, tal qual como o bacalhau, pois todos os dias foi diferente, na feitura, no tempêro, nos acompanhamentos ...
O encontro com o Vinho dos Mortos, para o qual trazíamos uma referência, aconteceu em Boticas. A questão era apenas saber como encontrá-lo?
Fomos ao Turismo e perguntámos. Indicaram uma casa particular, junto à saída de Boticas e lá fomos.
Recebeu-nos um senhor já de certa idade e quando pedimos Vinho dos Mortos, qual a surpresa de o ver pegar num sacho e ir direto ao quintal, onde começou a cavar ...
Lá apareceram as garrafas, escuras, sem rótulo e envolvidas em terra. Tínhamos descoberto o Vinho dos Mortos!
Invasões francesas na base do vinho dos mortos
A história remonta às invasões francesas, pois o povo, com medo de ser roubado, enterrava os bens, mesmo o vinho, no chão das adegas.
Quando terminaram as invasões, esperavam encontrar o vinho estragado, mas com surpresa constataram que estava mais saboroso, com graduação de 10/11º, palhete, com paladar único, algum gás natural, dada a fermentação no escuro e com temperatura constante.
Ficou com a designação por ter sido enterrado e continua a fazer-se localmente como forma de o conservar e melhorar.
Lembro-me de o ter experimentado na altura, era de sabor intenso, com muita espuma devido ao gás, que por vezes até fazia saltar a rolha, com os estragos dai resultantes ...
Tradição já não é o que era
Hoje já não tem a mesma emoção, pois são cada vez menos os agricultores que mantêm a tradição, não sendo já necessário desenterrar as garrafas.
Em Boticas existe uma adega, com um posto de venda à entrada da vila, que as vende, já engarrafadas, limpas, com rótulo e até embaladas em caixas de 2 ou 3. É também possível encontrá-las nos minimercados da terra.
Também o sabor e o gás estão diferentes, talvez mais industriais, mas a curiosidade permanece.
Um conselho, sirvam-no mais frio que um normal vinho tinto, pois acentua o sabor intenso.
RM
Agosto | 2013