Thursday, August 29, 2013

Vinho dos Mortos, uma referência ou apenas curiosidade?

Viagem ao nordeste, com dica sobre vinho dos mortos

O meu primeiro contacto com o Vinho dos Mortos já tem quase 20 anos e aconteceu numa viagem de amigos pelo Nordeste, onde todos os dias comemos posta.

Vinho dos MortosPara os que não sabem, nós então não sabíamos, existem muitas formas de apresentar a posta, tal qual como o bacalhau, pois todos os dias foi diferente, na feitura, no tempêro, nos acompanhamentos ...

O encontro com o Vinho dos Mortos, para o qual trazíamos uma referência, aconteceu em Boticas. A questão era apenas saber como encontrá-lo?

Fomos ao Turismo e perguntámos. Indicaram uma casa particular, junto à saída de Boticas e lá fomos.

Recebeu-nos um senhor já de certa idade e quando pedimos Vinho dos Mortos, qual a surpresa de o ver pegar num sacho e ir direto ao quintal, onde começou a cavar ...

Lá apareceram as garrafas, escuras, sem rótulo e envolvidas em terra. Tínhamos descoberto o Vinho dos Mortos!

Invasões francesas na base do vinho dos mortos

A história remonta às invasões francesas, pois o povo, com medo de ser roubado, enterrava os bens, mesmo o vinho, no chão das adegas.

Quando terminaram as invasões, esperavam encontrar o vinho estragado, mas com surpresa constataram que estava mais saboroso, com graduação de 10/11º, palhete, com paladar único, algum gás natural, dada a fermentação no escuro e com temperatura constante.

Ficou com a designação por ter sido enterrado e continua a fazer-se localmente como forma de o conservar e melhorar.

Lembro-me de o ter experimentado na altura, era de sabor intenso, com muita espuma devido ao gás, que por vezes até fazia saltar a rolha, com os estragos dai resultantes ... 

Tradição já não é o que era

Hoje já não tem a mesma emoção, pois são cada vez menos os agricultores que mantêm a tradição, não sendo já necessário desenterrar as garrafas.

Em Boticas existe uma adega, com um posto de venda à entrada da vila, que as vende, já engarrafadas, limpas, com rótulo e até embaladas em caixas de 2 ou 3. É também possível encontrá-las nos minimercados da terra.

Também o sabor e o gás estão diferentes, talvez mais industriais, mas a curiosidade permanece.

Um conselho, sirvam-no mais frio que um normal vinho tinto, pois acentua o sabor intenso.

RM

Agosto | 2013


Monday, August 26, 2013

Bom vinho, em terra de boa água


À descoberta de vinho transmontano 

Tenho por hábito, quando viajo, experimentar os produtos gastronómicos das regiões que vou visitar, escolhendo restaurantes locais que selecciono previamente, recorrendo a opiniões de amigos que por lá anteriormente passaram, ou a pesquisas na internet.

Vinha da Quinta de ArcossóDou tanta importância à componente gastronómica do passeio, como às feiras e festividades, quando existem, às visitas a monumentos e museus, ou ao usufruir de alguns momentos de tranquilidade, nesses locais, enquanto se saboreia um café acompanhado de um qualquer doce regional.

Recentemente, um passeio com amigos levou-me até ao Vidago, numa rota pelas reputadas águas da região, cuja frugalidade resolvemos combater com incursões pela boa carne barrosã e pelos enchidos e presuntos transmontanos. Quanto ao vinho, partimos com espírito de descoberta!

Achamento do vinho da Quinta de Arcossó

Foi logo no primeiro jantar no Vidago, que à habitual pergunta sobre quais os vinhos da região que recomenda, recebemos do empregado a indicação de que deveríamos escolher os vinhos da Quinta de Arcossó, a qual não distava muito do local onde nos encontrávamos.

Depois de analisadas as opções existentes, de seleccionada a ementa e tendo em atenção a elevada temperatura desse princípio de noite, optámos pelo Branco Reserva 2010, que nos surpreendeu pelos aromas e sabor frutado que todos reconhecemos permaneceu elegante e longamente na boca.

Apesar de ter uma percentagem de 20% de Moscatel Galego Branco (as restantes castas são 40% de Arinto, 20% de Côdega de Larinho e 20% de Alvarinho), esta casta não fica excessivamente presente no sabor do vinho, o que no meu caso considero positivo.

No almoço do dia seguinte, em Boticas, voltámos a ser aconselhados a escolher vinho da Quinta de Arcossó, tendo a nossa opção recaído no rosé, um excelente vinho, de cor invulgar,
elaborado a partir das castas Bastardo (90%) e Touriga Franca (10%).

Visita guiada à Quinta pelo proprietário

Prova de vinho da Quinta de ArcossóEmbalados pela curiosidade, pensámos  fazer uma visita à vinha cujas particularidades únicas foram sendo reveladas à medida que pesquisávamos: solo granítico, inclinação de 20%, 400 metros de altitude, encosta voltada a sul e de exposição convexa.

Foi com facilidade que chegámos ao contacto com o actual proprietário, que muito amavelmente nos esperou à entrada da vila de Arcossó, para nos conduzir à sua vinha e nos foi elucidando sobre a ancestralidade da produção de vinho na região, sobre as vantagens das características únicas do terreno e sobre o seu processo de produção de vinhos inteiramente artesanal.

Na adega, fomos provando, sempre com agrado, os diversos vinhos produzidos na Quinta, acompanhados pelas explicações pormenorizadas do Sr. Amílcar sobre as características dos mesmos, alguns ainda ausentes no circuito comercial.

Os tintos, que ainda não tínhamos experimentado, revelaram-se à altura dos brancos e rosés, especialmente o Tinto Superior Bago-a-Bago 2008 e o Tinto Reserva 2007.

Regresso com mala cheia

Como tudo o que é bom acaba depressa, os três dias que permanecemos na região do Vidago, esgotaram-se rapidamente, ficando, para memória futura, os momentos de convívio e as experiências com a gastronomia da região, apenas negativamente interrrompidos pelos sinais dos fogos que assolaram Boticas.

Sobre a nossa opinião acerca dos vinhos da Quinta de Arcossó, quer brancos, quer tintos, quer rosés, apenas podemos dizer que, enquanto estivémos na região, não mais precisámos de sugestões para escolha de vinhos e que, para prevenirmos eventuais dificuldades em os encontrar, na região de Lisboa, regressámos com a mala do carro cheia de caixas de todas as variedades.

Vinho da Quinta de Arcossó
Se não conhece os vinhos da Quinta de Arcossó, aproveite a próxima viagem à região de Vidago para fazer a prova. Vai ver que, como nós, não se vai arrepender!

VL

Agosto | 2013

Monday, August 19, 2013

Quinta Nova, um Paraíso no Douro


Chegar ao Paraíso é a única dificuldade

Até ao Pinhão tudo fácil, com paragem quase obrigatória para rever os azulejos da estação de comboios e passar num talho da rua principal para provar e comprar uns enchidos locais, com nomes e sabores muito particulares, acompanhados do sempre presente vinho do Porto. 

Depois embarcar, com um grupo de amigos, na aventura de Vinhos e Gourmet prometida para a Quinta Nova da Nossa Senhora do Carmo, que já tínhamos avistado, do outro lado do rio, no caminho da Régua para o Pinhão. 

E fomos para a estrada, sempre sinuosa, cada vez mais estreita e mais alta, com o rio a espreitar e o precipício mesmo ao lado ...

Fundamental fazê-la de dia, idealmente com bom tempo, pois a atenção tem de ser muita e esperar que não haja muito carro em sentido contrário.

Paisagem deslumbrante

Estamos a chegar e a paisagem começa a fazer efeito, obrigando por vezes a parar para saborear e fixar o momento.

Entramos na Quinta e o choque dos sentidos começa logo ali, pois era Primavera, pelo que fomos recebidos por uma paleta impressionante de cores, todas as cores das flores que circundam o caminho. 

Depois o bom enquadramento dos edifícios na paisagem, quinta, adega, capela, nada a chocar com o ambiente que nos rodeia.

Finalmente no centro da Quinta o choque mais impressionante, o estarmos rodeados de vinha, com o Douro a correr de forma preguiçosa lá em baixo, sentir o que é na verdade o Património da Humanidade, julgar que chegámos a um Paraíso no Douro. 

Vínhamos com o Programa completo, vinhos, gourmet, dormir, desfrutar o máximo na Quinta, pelo que a primeira impressão foi soberba, não só pelo tal choque dos sentidos, beleza e cheiros, como pela simpatia da receção. 

Para os mais corajosos e para abrir o apetite, impunha-se um passeio pela vinha, com descida até ao Douro, que é um desafio, mesmo no percurso mais curto, para os mais resistentes, pois com o sol a bater e a inclinação dos terrenos, é obra. O que será com um cesto carregado de uvas?

Percurso Vinícola

Depois de recuperarmos do percurso, iniciámos o outro, o vinícola, logo muito acima, pois foi a prova dos Grande Reserva - Touriga Nacional, Clássico e Referência, com uma grande unanimidade e aprovação e muita discussão e divergência quanto ao preferido ... gostos!

Todos os vinhos têm elevada concentração de cor e sabores complexos na boca, com aromas muito frutados, habituais na zona, mas foram eleitos pela sua qualidade. 

Antes do jantar, nova incursão, com um branco muito especial que nos tinha sido recomendado pela Renata, amiga de um dos elementos do grupo e grande responsável por esta nossa descoberta do Paraíso.

Pomares Moscatel Galego, pomares inspirado nos que existem na Quinta desde o século XVIII, em harmonia com a vinha, Moscatel Galego, casta existente em algumas zonas junto ao Douro. É um vinho muito intenso, com um sabor envolvente do paladar, a não perder ... 

Jantar para recordar

Durante o jantar, que foi uma experiência gourmet muito compensadora, avançámos para os Grainha, Reserva Branco e Reserva Tinto, com rótulos muito surpreendentes, pois o nome é apresentado em 18 línguas. São vinhos com impacto no nariz, pela sua complexidade, bem como na boca, pela sua concentração de sabor. 

Para terminar, imprescindível provar o Clã Special Reserve, vinho do Porto de vinhas entre 20 e 30 anos, que foi uma agradável surpresa. Cor intensa, macio, mas com frescura de aromas e um final persistente. É para repetir! 

Depois destes desafios, foi um lento arrastar até ao quarto, subir com dificuldade para a cama e dormir que nem justos a noite toda ... 

Despedida com promessa de regressar

Acordar de manhã, sentar num dos bancos que estão espalhados pela Quinta e sentir o silêncio da paisagem, renovada pelos primeiros raios solares, é um momento mágico, de que o video da Quinta é uma pequena amostra.

Chegou a hora de nos fazermos à estrada, a tal, sem nos esquecermos de comprar alguns dos produtos da Quinta, vinhos, azeite... e nos despedirmos da inexcedível Susana que tão bem nos tratou, a quem prometemos regressar, pois para o Paraíso não custa voltar.

RM

Agosto | 2013



Friday, August 16, 2013

As boas adegas de Estremoz



Uma terra abençoada                     

Tenho o hábito de comprar os vinhos que consumo, diretamente nas adegas produtoras. Embora saiba que, regra geral, o seu custo é mais elevado do que nas grandes superfícies, dá-me um prazer enorme visitar esses locais e fazer aí as compras. É um excelente pretexto para fazer turismo.

Uma das regiões que considero abençoadas pela natureza, para a produção de vinho, é Estremoz.

Costumo dizer que daí não é necessário conhecer marcas de vinho ou adegas: se é de Estremoz é bom.

Uma a duas vezes por ano visito algumas adegas de Estremoz e aproveito para almoçar e/ou jantar nos excelentes restaurantes dessa região. Também em matéria de culinária existe aí uma variada e excelente oferta.

Para os menos conhecedores da região deixo aqui as minhas referências para uma visita e a prova dos respectivos vinhos:

  • ·       Encostas de Estremoz;

  • ·       Seis Reis;

  • ·       João Portugal Ramos;

  • ·       Herdade das Servas;

  • ·       Dona Maria;

  • ·       Quinta do Mouro.

Este roteiro faz-se facilmente num fim de semana porque Estremoz é servida por auto-estrada, hoje em dia quase deserta, está situada no centro do país, a apenas 150 km de Lisboa e as adegas estão muito concentradas à volta da cidade, como se pode ver neste mapa.

Para além do prazer do vinho, acresce que algumas das adegas são lindíssimas em termos de arquitectura e de enquadramento. Nesta perspectiva, destaco as adegas de Monte das Servas,  João  Portugal Ramos e a Quinta de D. Maria (infelizmente esta costuma estar fechada ao fim de semana!).

Para quem gosta do Alentejo, da boa comida e do bom vinho, recomendo vivamente este roteiro. Será um fim de semana para recordar e, acredito, para repetir.

MF

Agosto | 2013


Wednesday, August 14, 2013

Em defesa do vinho branco

 
Vinhos brancos de norte a sul de Portugal

Muitas vezes se ouve dizer que vinho é tinto!

Também existe uma ideia que o tinto é bom para a saúde e o branco nem por isso.

Sem entrar em polémicas, a minha defesa do vinho branco assenta em dois princípios: 

  1. Existem brancos tão bons como muitos tintos;
  2. Fazer bem ou mal à saúde, depende de cada um e da qualidade e quantidade que se bebe.
Em determinados países, apenas os tintos apresentam qualidade, noutros apenas os brancos, enquanto que os restantes, menos afortunados, se limitam a comprar a quem os produz ...

A vantagem de Portugal, como país e com esta dimensão, é a enorme diversidade de opções, com apostas seguras, quer em tintos, quer em brancos, quer em rosés.

A minha opção de vinhos brancos cai, preferencialmente, por brancos com sabor forte, normalmente com graduação mais elevada, embora a comida que o acompanha possa ser determinante na escolha final.

Correndo ao acaso pelo país, aqui junto algumas das minhas apostas.

Chardonay, embora sendo uma casta não nacional, está cada vez mais presente, por aqui e por ali, sendo uma das minhas preferidas. A minha escolha, a norte, aponta para o Quinta de Cidrô Reserva, da Real Companhia Velha, com cheiro e sabor bem intensos.

Encruzado, opção portuguesa, representado nas Beiras, com paladar bem especial. Gosto particularmente dos encruzados da Casa da Ínsua e da Quinta das Marias, este bem mais exigente para se adquirir.

Na região do Tejo e em particular no Ribatejo, várias opções muito interessantes e com preços simpáticos, Quinta da Lagoalva de Cima, Quinta da Alorna Reserva, Guarda Rios, predominando Arinto/Chardonay.

Já no Sul, embora existam várias soluções com as caraterísticas que aprecio, a melhor escolha é o Monte das Servas, colheita selecionada ou escolha, predominando a casta Roupeiro, pelo equilíbrio entre qualidade e preço.

Ficam aqui as minhas escolhas, muito pessoais, associadas muitas vezes a boas recordações, numa refeição, ou num simples convívio, em que o vinho branco, especialmente o produzido em Portugal, merece esta defesa.


RM

Agosto | 2013

Monday, August 12, 2013

Vinho tinto ribatejano de castas estrangeiras



Tributo aprovado!


Há uns tempos atrás, cruzei-me, em Almeirim, com o Rui, um amigo de longa data, desde muito novo ligado profissionalmente ao mundo do vinho.

Após os “há tanto tempo que não te via” e os simpáticos “estás na mesma”, concordámos em beber um café juntos para partilhar notícias sobre amigos comuns e falar um pouco sobre um tema que nos seduz: o vinho.

Foi ele que me falou pela primeira vez no Tributo, um vinho produzido pelo Rui Reguinga, um enólogo e viticultor da região de Almeirim.

Contou-me esse meu amigo, que o vinho resultou de uma vinha plantada nuns terrenos da Charneca de Almeirim, num solo cheio de calhaus e que as castas não eram as tradicionais ribatejanas, mas sim Syrah, Grenache e Viognier.

Mas nessa narrativa, o que mais prendeu a minha atenção foi a aparente razão pela qual o nome do vinho surgiu. Terá sido um tributo do filho à memória do pai, entretanto falecido, que era viticultor e que foi o responsável pela plantação da vinha.

Influenciado ou não pela história, o certo é que, poucos dias depois, dirigi-me a uma loja de vinhos, em Almeirim, para saber se tinham o Tributo e comprar umas garrafas para partilhar com uns amigos que iam almoçar a minha casa.

Foi aí que verifiquei que o Tributo 2010 tinha acabado de ganhar o primeiro prémio, na categoria de vinhos tintos, na 10ª Edição da Essência do Vinho, facto que me tinha escapado e que o Rui omitira, o que reforçou ainda mais a minha curiosidade.

Confesso que sou um apaixonado por vinho que contenha alguma Touriga Nacional, o que não acontece com o Tributo, mas isso não impediu que tenha gostado, por ser um vinho diferente e muito equilibrado.

Sobre a opinião dos amigos que estiveram nesse almoço de sábado e que comigo partilharam o Tributo, apenas posso dizer que me “obrigaram” a ir com eles a Almeirim, comprar umas garrafas para levar para casa, uma vez que tinham ficado fãs do vinho.

Em relação ao preço, que desconheciam até esse momento, limitaram-se a dizer que, apesar da crise, é preciso pagar o tributo a um bom vinho.

VL

Agosto | 2013

Thursday, August 8, 2013

Vinho branco de uvas tintas



Invisível: difícil de encontrar


Sou habitual frequentador de um restaurante, para os lados de Campo de Ourique, em Lisboa, que trata bastante bem os saberes e sabores do Alentejo, mesmo os mais light.

Numa dessas vezes a escolha do vinho resultou de uma proposta do empregado, com o sugestivo nome de Invisível.

A primeira impressão foi de estranheza, dada a garrafa diferente no formato e na cor, mas a região era de qualidade sólida, Monsaraz, Adega da Ervideira.

Abrimos e a surpresa continuou: cor, cheiro e sabor diferentes. Ausência do tradicional Arinto. E continuou, pois a casta era Aragonez, normalmente usada para vinho tinto, logo era um vinho branco, feito com uvas tintas!

Gostámos bastante do seu sabor suave, que acompanhou muito bem aquelas amêijoas com a arroz de coentros ...

Continuamos a consumi-lo, muito embora por vezes faça jus ao nome e seja difícil de encontrar, pela exclusividade da sua produção, sendo também importante saber o preço adequado, pois tem "tendência" a variar de forma significativa.

O Invisível "mostra-se" como uma opção a partilhar, por ser diferente e por valer pela sua qualidade.

RM

Agosto | 2013